Percursos...
(Cópia
Óleo sobre tela Elisabete Sombreireiro Palma)
PERCURSOS
Rogério Martins Simões
Andamos aos poucos
a escrever o livro das nossas vidas.
A libertação tem o seu preço,
pagamos caro a mudança,
sacudindo as roupa envelhecidas…
Que é feito dos vestidos de chita?
Onde estão os dedos finos delicados
que enrolavam os cabelos do menino?
E os caracóis? E as gotas
com que rebuçava o olhar de mel?
Tartarugas luzidias rastejam
recordando que já foram cágados…
Abro o saco e liberta-se
um louva-a-deus…
Manejo uma espada de madeira,
herói da banda desenhada.
Ergo a espada de nada
e faltam-me as sílabas
que se escaparam
das folhas arrancadas.
Ainda assim quero escrever,
quero borboletear faíscas
para não ficar cego…
As recordações são agora
monstros cospe-lume,
dragões afinados…
Cordas partidas de um violino.
Liberto as claves de sol
para de novo te ver sorrir!
Um canto adormecido
embala docemente
um berço de silêncio.
Recupero o leite materno
num figo verde,
lábios rasgados.
Chupo um rebuçado
com sabor a mentol.
A tinta permanente secou!
O mata-borrão
levou as pontas do meu nome
(bem desenhadas
para caber entre duas linhas.)
Entrelinho as palavras desalinhadas.
Não dou a mão à palmatória.
Quando tudo passar serei glória.
Por agora vou afinando
as cordas estropiadas,
velha amarra dum batel.
A espada é agora pó
e já foi serradura…
Os cabelos, caracóis finos,
afinaram os violinos
numa nuca envelhecida
e cantaram vitória…
Ainda assim a fogueira
não destruiu tudo
e o combate ao dragão
queima-tudo,
ainda agora começou.
O fumo das folhas
é agora nosso.
E os versos também…
26-02-2007 0:23:20
(Ao correr da pena, dedicado à poetisa