DIÁSPORA
Rogério Martins Simões
Gosto de viajar para casa.
Regressar é um desejo de quem parte
E não quer ir.
Vou!
Já fui tantas vezes na ventura
Calcetando pedras,
Dormitando em tábuas,
Onde me perco sem contemplações,
Encalhado nos confins das terras,
Para amealhar uns tostões.
Tivesse asas para acompanhar o pensamento…
Que as asas só se levantam tendo penas.
Penas eu tenho!
Pena não tenho da fome e dos xailes pretos…
Deixei em casa corpos em metamorfose,
Silêncios e silvas,
Que crescem entre os muros e dão amoras…
Comprei a última tesoura de podar:
Tenho a barriga a dar horas
E um sonho para voltar...
A vinha ficou brava…
A casa fechada e a hortas são agora pasto de chamas!
- Aldeia porque me chamas filho
Se eu só tive madrasta!?
- Nação porque me pedes o voto se já nem te sei ler!?
Gosto de regressar, mas não posso ficar…
Falo agora esta meia língua estranha,
Porque já esqueci a minha…
Volto a percorrer as estradas
Que me afastam do que resta...
Levo uns trocos para a viagem
E, quando lá me virem,
Vai ser cá uma festa….
Vou petiscar couratos
E beber uns copos
Com os rapazes do meu tempo.
Regressarei um dia para cuidar da vinha…
Por agora durmo a sesta…
Voltarei para cumprir a promessa…
Beberei, nos corpos deixados,
Um néctar guardado
Entre fragas e pinheiros…
Agora tenho de ir…
Regressarei à casa nova que construí
E em cada degrau
Limparei as lágrimas definitivas
Da minha saudade.
Vou partir mas quero regressar…
Oh Pátria amada,
Onde se acolhem os sonhos do meu regresso:
- Porque me deixaste partir?
Oh Pátria amada deixa-me regressar
Ainda que só te enxergue,
No que resta,
Dos penhascos e das pedras pretas.
Quero todo o barro, granito e lousa.
Quero a água cristalina que emergia das fragas.
Quero depositar uma coroa de rosas
Nas campas rasas dos meus pais.
E uma coroa de espinhos nos que me obrigaram a seguir…
Sonhei voltar!
Não voltarei para partir…
Não voltarei a sonhar.
Vou ficar!
Tenho filhos e netos neste lugar
Retalha a saudade
No que resta do meu corpo!
Viajarei gavião….
Por agora recebo notícias do meu país
- Dizem que as motas todo-o-terreno
Debutaram nas silvas da minha aldeia…
E se a língua portuguesa
é a minha raiz profunda,
Afundo as minhas mágoas
por não poder regressar
Porque regresso escreve-se agora noutra língua.
E eu já nem sei o caminho do retorno…
8/03/2007
Simões, Rogério, in “GOLPE DE ASA NO SEQUEIRO”,
(Chiado Editora, Lisboa, 1ª edição, 2014)
ISBN 978 989 51 1233 3
Poemas de amor e dor
conteúdo da página
publicado às 19:37
POR QUE SOU TRISTE?
Rogério Martins Simões
Saber, quero saber por que sou triste?
Querer, por mais querer, o riso ensejo.
Chorar? Não mais chorar é meu desejo.
Saber por que razão meu choro insiste?
No meio deste silêncio, e que persiste,
Razão tem a razão em que me revejo.
Chorar será o clamor do meu arpejo.
Saber, quero saber em que consiste.
Perguntei ao meu rio Tejo, a soluçar,
Que me desse a razão deste meu estar:
Saber, quero saber que fiz de errado?
Sorrindo para mim para que o visse,
Cuidai desse teu riso, e mais me disse:
- Chorar, e mais chorar, será teu fado…
Meco, Praia das Bicas, 2013-12-12
Simões, Rogério, in “GOLPE DE ASA NO SEQUEIRO”,
(Chiado Editora, Lisboa, 1ª edição, 2014)
Poemas de amor e dor
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publicado às 21:51
TRISTEZA NO MEU OLHAR Rogério Martins Simões
Quanta tristeza tem este meu olhar.
Que aos poucos vai morrendo: que viver?
Se lentamente passo este sofrer:
Neste viver, assim, sem desejar.
Já passei tantas datas por datar…
Mais que os anos, perdidos, sem os ver
Que para mais estar, e sem morrer,
Na morte vive quem mais esperar.
Que não seja por mim a pouca sorte,
Pois que, neste meu invólucro de morte,
É na vida que a alma se deslinda.
E neste desespero em que me vejo,
Minha alma, num momento de sobejo,
Recorda-me que não quer partir ainda.
Meco, 05/03/2015 19:30:42
Simões, Rogério, in “POEMAS DE AMOR E DOR”,
(Chiado Editora, Lisboa, 1ª edição, 2019)
1ª edição: Agosto, 2019
ISBN: 978-989-52-6450-6
Depósito Legal n.º 459328/19
Poemas de amor e dor
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publicado às 17:34
POBRE HUMANIDADE
Romasi
Rogério Martins Simões
Ah génio do homem apodrecido…
Ai do homem em palácios… deitado
Convencido que o seu irmão desaparece.
Ai de mim, eu, sabiamente letrado,
E em paz deixado,
Convencendo os outros do nada.
Pobre humanidade
Estrelada de ilusões e ofensas
Passeando em cachos
Ao sabor da corrente…
Tu e eu seremos
Espancados com a razão…
Se acordarmos amanhã…
Odivelas 24/04/1974
(Registado no Ministério da Cultura
Inspeção-Geral das Atividades Culturais I.G.A.C.
Processo n.º 2079/09)
Poemas de amor e dor
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publicado às 19:32
PASSAGEM DOS DIAS…
Rogério Martins Simões
Uma nova semana começou.
Mas existem tantos seres humanos
que nem já se importam
com a passagem dos dias.
Outros,
nem sequer têm lágrimas p´ra mais chorar.
O sofrimento é tão cego
que cega a esperança,
e nem mesmo a fé
virá em seu auxílio.
Que triste é viver
emparedado na solidão
e no desconforto da espera
pelo final dos tempos.
E vós,
cuja missão é bem maior que o tilintar dos euros,
não esperem!
E continuai a dar esperança a todos aqueles
por tanto sofrerem
MAIS NÃO VIVEM.
Lisboa, 25 de novembro de 2019
(Direitos de Autor)
Poemas de amor e dor
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publicado às 14:22
ANTECIPAÇÃO
Rogério Martins Simões
Falas comigo de tão perto
Mas tão afastado de mim.
Agora reparo:
Que os dias são medidos.
Que a solidão é desmesurada.
Não! Não quero contemporizar
Nem antecipar o final
Mesmo que o frio se apresse
Em ler no teu olhar
O meu último suspiro.
Lisboa, 17/07/2017 21:40
Poemas de amor e dor
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publicado às 16:06
CANTO O IMPREVISTO
(Rogério Martins Simões)
Canto o imprevisto
O que se espera e não espera
Canto o que conto, e não conto:
Tenho andado em viagem
Sem tempo.
Acordo cansado,
Deito-me cedo
Cedo ao meu corpo fatigado
E neste tormento
Sem razão aparente,
Neste aparente cansaço:
Não sei por onde ando.
Ando por aí
Em busca de qualquer coisa
Que nem sei onde está.
Olho a televisão
Nada vejo que me encontre.
Olho as molduras
Leio os rostos que conheço,
Amo os que não esqueço.
Daria tudo
Por uma forte gargalhada,
Sonora, repetitiva:
Rindo, rindo, sem parar.
E neste meu silêncio, em que me silencio
Quero rir para não chorar.
04-03-2005
(Para um suposto 3º livro)
Poemas de amor e dor
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publicado às 21:50
O FADO Rogério Martins Simões Quem da vida se não farte, e esperto,
Acerta a arrogância e a postura;
Pois dote de orador terá o decerto,
Cavaleiro de tão triste figura…
Que sendo pior que burro e burro certo,
Têm na melosa voz fatal falsura,
Para assim esgrimir demais o incerto:
A eito e a preceito na tal conjuntura…
Nesta tão pouca sorte e má contenda,
Há um povo que parte na triste senda,
Sem ter destino ou sorte, e esmorece.
Assim se vejo aqui o próprio demérito
No presente de tal e qual pretérito:
É fado! “Malhas que este Império tece”!
Meco, 20/09/2013 01:20:17
(Simões, Rogério, in “GOLPE DE ASA NO SEQUEIRO”,
(Chiado Editora, Lisboa, 1ª edição, 2014)
ISBN 978 989 51 1233 3) (Página 141)
Poemas de amor e dor
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publicado às 15:46
CICLO FECHADO!
(O MEU SEGUNDO GRITO!)
Rogério Martins Simões
Se o teu rosto não sorri,
E o teu cabelo não desliza,
É porque a tua boca se encerra,
E a minha não será precisa…
O gesto, o medo, o ódio:
Tudo te corrompe.
E, até, não preciso de ponte
Encheste-me a baliza…
Espalhou-se a brisa;
Abriu-se a porta de vidro;
A janela da esperança;
E o vento até desliza…
Mas… se ao menos O teu rosto sorrisse!
E os teus cabelos se soltassem
Voltarias a encontrar
Os melhores passos para ti,
Porque o melhor de ti fui eu
Que adoecia dizendo olá!
O melhor de ti fui eu
Que te segurei, quando fugias...
Ou então sempre errei
Quando te amparei E tremias.
Não!
Nada sobrou de mim
Não me faças sentir assim
Pois tudo agora findou.
Sabes!
Tudo é nada
Quando nada começa!
E o fim não existe
Se não há princípio.
Para quê essa pressa!?
Se o inicio era nada,
E tudo foi retalhado:
Nefasto é o sofrimento
Quando não há, sequer, sentimento!
Se assim não fosse
Poderias dizer, ao menos, como eu
Longe!
Muito longe de ti.
Olá!
Olá poeta!
Não fiques desesperado
Não faças nada apressado!
Não!
Não penses sequer Que te quero!
Quem quer o nada
Se nada tem?!
Tu não vês que não há regresso
Quando não há ponto de partida!
E tu nem entendes a chegada...
Olha!
Eu tinha um guizo,
Cabeça de andorinha,
Que corria atrás do vento
Ao desafio com as aves.
À procura de outras asas!
E voava,
Voava, sem ser preciso.
Chamavam-lhe cabeça de vento…
Certo dia fugiu,
Voou numa folha de papel
Toquei novamente o guizo,
E tantas vezes subiu
Que se partiu o cordel.
Sabes!
Agora quero sorrir!
Tenho gosto, tenho vida!
Despejei a "selha de lágrimas"
Encontrei-me no "corpo ausente"
E num arco-íris
Descobri manhãs
Com que sonhei e sempre quis.
Afinal estou magoado!
Porque fui muito infeliz!
Mas não há dúvida!
Ainda serei feliz!
Lisboa, 1989
Poemas de amor e dor
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publicado às 21:45
PLANTO ROSAS
Rogério Martins Simões
Quanto maior o desassossego
Maior é a viagem sem destino.
Vai tempo que fechava os olhos
Deixava esvoaçar os meus sonhos
Como se fossem bolas de sabão.
Duravam uma eterna ilusão.
Hoje planto rosas!
- Que sorte tens com as flores!
Gosto de rosas de todas as cores;
E de cravos vermelhos!
Quis Deus que voltasse a sonhar
Mesmo que apenas se cumpra uma parte dos meus sonhos,
Foi bom vê-los voltar.
Hoje colho rosas…
Lisboa 2008
Poemas de amor e dor
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publicado às 18:51