TRILHOS DA DESESPERANÇA
Rogério Martins Simões
Quando os povos não se levantam
E não enfrentam as horas da revolta.
Quando os navios sulcam
As lágrimas da partida…
Até os velhos seguem
Os trilhos da desesperança…
Meco, 22/01/2014 18:08:36
Poemas de amor e dor
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publicado às 00:23
(Claude Monet)
TURBULÊNCIA
Rogério Martins Simões
Consciente do contraste que arrasto,
nos piores dias, quando me escondo
entre quatro paredes e me sufocam.
Quem me dera acordar da surdina
das palavras….
Na inconsciente turbulência
dos poemas que deixo de escrever,
que grito, e vão por aí.
Hoje sou eu próprio:
A métrica repetida
dos cantos marginais
e colectivos de dor.
Sou um completo deslize,
fora de tempo,
sem dar tempo
às palavras do coração.
Sou uma vaga de frio
que se enrosca pela manhã
numa tosse compulsiva.
Sou como uma fábrica,
sem chaminés,
encimada, “brada aos céus”…
Quem me dera ter manhãs
luzidias
de oblação e de oferendas…
E de repente,
como que a força que retém
a minha mão esquerda
rompesse a bruma da manhã,
apetece viajar,
subir ao mastro dianteiro
e cobrir a minha face lambida
de sal e mar.
24/02/2006
Poemas de amor e dor
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publicado às 00:12
O meu poema
Romasi
Ando
De casa às costas
Minha cama
É de bambu.
Meu cobertor
É de cinza.
E o meu corpo
vestido
Está nu…
11/4/1975
Poemas de amor e dor
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publicado às 22:15
O ciúme mata…
(Rogério Martins Simões)
Abri a janela de meu quarto
Quatro paredes, um deserto…
Tenho a sensação de estar farto!
E o chão ali por perto...
Afunda-se a noite na alma
Na dor, por amor, tanto sofreu
Esta noite não está calma,
Está tão escura como o breu
Clamo por minha loucura
Quatro paredes um deserto…
Não tenho medo da altura
E o chão ainda mais perto...
Olho de novo para o rio
Hoje não há luar de prata
É verão e tenho frio
E o meu ciúme mata.
Pairam as nuvens que o ciúme deu
A lua não tem mais lugar certo
Amor o que te aconteceu?
Tristemente perdido perto…
1989
Poemas de amor e dor
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publicado às 00:33
ESTAS PALAVRAS, AGORA, NÃO SERÃO VIRGENS
(Rogério Martins Simões)
Quando o desespero nos aperta
E do peito saem soluços
É que o gesto
Toma o lugar incerto
O caminho louco
Corre louco
Como a pena com que escrevo.
Alinho minhas palavras
Cem palavras
Ritmadas
A muita pulsação
Por minuto
E nesta cadência
Arrasto
Meu arrasto
Minha canoa virada ao tempo.
E que gesto
Meu gesto se transforma
Num acto
Numa viagem apressada
Cadenciada
Vencendo quem sabe
O desastre que arrasto
À razão do tempo adulto.
Que decência é a cadência do gesto
Do acto
Porque neste momento exacto
Mais palavras não serão virgens…
1978
(Caderno Uma Dúzia de Páginas de Poesia n.º 41)
Poemas de amor e dor
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publicado às 23:50
(Óleo sobre tela Elisabete Sombreireiro Palma)
FORA DE TI SOU UM NOVELO
Rogério Martins Simões
Erguem-se as montanhas.
Perfilam as imagens.
Vêm através de mim,
ensina-me o caminho das margens…
Meu amor volta depressa
Tenho as minhas mãos tão pesadas
Que nem as mando poisar
Meu amor regressa
Tenho as mãos tão cansadas
E não as posso libertar.
Fora de mim sou um novelo,
que se desprende,
entre os dedos alinhados.
Fora de ti sou um elo,
que se prende,
entre os dedos desalinhados
Tenho as mãos tão pesadas
não as consigo desapertar.
Tenho as mãos tão cansadas
Que não as consigo soltar….
Salta para o meu cavalo de chuva
que se ergue à porfia.
Vem de um pulo só.
Leva-me contigo depressa
Meu amor regressa
Tenho as minhas mãos tão pesadas
Que nem as mando poisar
Meu amor volta depressa
Tenho as mãos tão cansadas
Que nem as posso libertar.
03-05-2006 15:30
(À minha companheira BETE que pinta
e com a tinta do seu amor suaviza a minha Parkinson)
BETE
Amor da minha vida, minha companheira, esposa e pintora.
Não existem palavras suficientes e bonitas, (pois linda és tu!), para te expressar o que sinto neste instante, pela tua dignidade, pelo amor demonstrado ao longo destes anos de enorme sofrimento que ainda agora começa…
Este é o teu mês - balança que equilibra o que resta de mim.
Até ao dia do teu aniversário, 19 de Outubro, voltarei a colocar aqui alguns poemas que te escrevi. Começo por este poema, “fora de ti sou um novelo”, que te dediquei quando estiveste internada e me sentia perdidamente à deriva…
Sempre
Rogério
Bete
Rogério Simões
Bete
Janela aberta
Sol penetrante, o teu,
Na hora certa:
Tão radiante e meu!
19/10/1999
Poemas de amor e dor
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publicado às 00:00
(Foto cedida pelo Sr. Padre Pedro)
NO DESESPERO DO GESTO
Romasi
No desespero do gesto
Do acto à rotura no amor
Há um rompimento modesto
Entre o sofrimento e a dor
Não há amor sem tempero
(Olhos mordendo o rosto)
Nem recuos no desespero
Nem avanços no desgosto
E se no momento do acto
O acto ultrapassar a razão
Chegou o momento exacto
De passar do acto à acção
Pelo acto da partida
Pela porta ou pelo ar…
Conseguirei entrar na vida
Onde vida tiver lugar…
1975
Poemas de amor e dor
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publicado às 22:22
SECA A BOCA
Romasi
Seca a boca
corta a garganta
e a lâmina penetra…
Afundo…
No fundo,
o fundo chama.
A chama ateia…
à teia onde me enlaço:
O laço!
O abraço!
A sede…
que me asfixia a garganta...
Ai a chama!
Ai o medo!
O abraço onde cedo…
Seca-me a boca
e encho a taça.
Choro as minhas lágrimas
asfixiadas!
- Vai-te embora!
Quero continuar só…
Lisboa, 1984
Poemas de amor e dor
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publicado às 00:00
CLAUDE MONET
Palavras amargas
Rogério Martins Simões
Grito, castigo,
Amigo,
Ponte.
Atravesso a ponte
Nadando.
Penando
E para aqui ando…
Andei para a ponte…
Atravessei o muro…
A murro, a cinto
E sinto o meu corpo
Tingido de púrpura…
Aponto!
Aponto…
Todos os dias a consciência
Aponto a continência
A abstinência
A turbulência
Que me lixa o peito
Que me traz vivo.
Agito
Este carvão consumido
Agito a minha ida
E vou a nado
Para a outra margem
Salto a torre de menagem
E de lá parto, também,
Sem saber para onde.
Quero resistir
Os tempos são de mudança
Sei para onde quero ir
Parei na descida
Regressa a minha confiança
Tenho de refazer a minha vida…
1989
Poemas de amor e dor
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publicado às 12:10