Diáspora
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Leiam por favor o que no século XIX, sobre a emigração escreveu: António Correia Herédia
(1822 – 1899)
Na Biblioteca da Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o consumo encontrava-se, no tempo em que lá trabalhei, um Relatório, em forma de livro, com 130 folhas, editado pela Imprensa Nacional no ano de 1876, intitulado “RELATÓRIO do PROJECTO DE REGULAMENTO GERAL DAS ALFÂNDEGAS pelo Inspector das Alfândegas António Corrêa Heredia”. Penso mesmo que este importante trabalho deveria ser reeditado a bem da cultura portuguesa.
Depois de “folhear” este magnífico trabalho concluí que foi seu autor, António Correia Herédia, um Ilustre colega das Alfândegas Portuguesas que tinha a categoria profissional de Inspector das Alfândegas, chefiando a Alfândega do Porto.
António Herédia inicia do seu relatório, a fls. 3, e passo a transcrever uma ínfima parte para situar no tempo o seu autor. Este magnífico e pioneiro trabalho inclui citações e ideias bem interessantes e, quiçá, a repensar nos dias de hoje:
Referindo-se a uma polémica quanto à emigração da Ilha das Flores para a América do Norte e à livre troca entre as Flores e o Corvo diz entre outras citações a seguinte:
“A emigração não é uma viagem de recreio; ninguém abandona com prazer a terra natal; a saudade da pátria é um mal que não tem compensação nem lenitivo. Quando se emigra é porque todas as esperanças acabaram, e porque o futuro, que se antolhava medonho, já deixou de ser futuro, e o infortúnio caiu como rochedo sobre a cabeça da sua vítima que foge quando pode, e tão depressa pode, da terra onde é assim esmagada. E não há direito para dizer ao que de tal modo se separa de uma sociedade mal organizada «não vades, que tendes aqui obrigações para cumprir» ”
Meco, 17/1/2014
Rogério Martins Simões
DIÁSPORA
Rogério Martins Simões
Gosto de viajar para casa.
Regressar é um desejo de quem parte
e não quer ir.
Vou!
Já fui tantas vezes na aventura
calcetando pedras,
dormitando em tábuas,
onde me perco sem contemplações,
encalhando nos confins das terras,
amealhando uns tostões.
Tivesse asas para acompanhar o pensamento
porque as asas só se levantam tendo penas.
Penas tenho!
Pena não tenho!
- Da fome e dos xailes pretos…
Deixei em casa corpos em metamorfose,
silêncios e silvas,
que crescem entre muros e dão amoras…
Comprei a última tesoura de podar
Tenho a barriga a dar horas
E um sonho para voltar...
A vinha ficou brava…
A casa fechada, e a horta,
são agora um pasto de chamas.
- Aldeia porque me chamas filho
se só tive madrasta!?
- Nação porque me pedes o voto
se já nem te sei ler!?
Gosto de regressar mas não posso ficar…
Falo agora esta meia língua estranha,
porque já esqueci a minha…
Volto a percorrer as estradas
que me afastam do que resta...
Levo uns trocos para a viagem
e quando me virem vai ser cá uma
festa….
Vou petiscar couratos
e beberei uns copos
com os rapazes do meu tempo.
Regressarei um dia para cuidar da
vinha…
Por agora durmo a sesta…
Voltarei para cumprir a promessa…
E beberei nos corpos deixados
um néctar guardado,
entre fragas e pinheiros…
Verberarei palavras de fel,
embrulhadas com cargas de explosivos,
abrindo estradas;
Caminhos que me deixaram partir.
Agora tenho de ir…
Regressarei à casa nova que construí
e em cada degrau
limparei as lágrimas definitivas
da minha saudade.
Vou partir mas quero regressar…
Oh Pátria amada,
onde se acolhem os sonhos do meu regresso:
- Porque me deixaste partir?
Oh Pátria amada deixa-me regressar
ainda que só te enxergue,
no que resta,
dos penhascos e das pedras pretas.
Quero todo o barro, granito ou lousa
Quero a água cristalina que emergia das
fragas.
Quero depositar uma coroa de rosas
nas campas rasas dos meus pais.
E uma coroa de espinhos nos despojos
dos que me obrigaram a seguir…
Sonhei voltar!
Não voltarei para partir…
Não voltarei a sonhar.
Vou ficar!
Tenho filhos e netos neste lugar
Retalha a saudade
no que resta do meu corpo!
Viajarei gavião….
Por agora recebo notícias do meu país
- Dizem que as motas todo-o-terreno
debutaram nas silvas da minha aldeia…
E se a língua portuguesa é a minha raiz
profunda,
afundo as minhas mágoas por não poder
regressar,
Por que, agora, regresso escreve-se
noutra língua
e já nem sei o caminho de retorno..
8/03/2007
(Registado no Ministério da Cultura
- Inspecção-Geral das Actividades Culturais I.G.A.P. –
Processo n.º 2079/09)
(Óleo sobre tela Elisabete Sombreireiro Palma)
(Capela da Póvoa - Pampilhosa da Serra)
RAMA
Rogério Martins Simões
Um ramo!
E na ramagem um sonho
Deixado pelo ninho,
atrás dele,
voando por além…
Um passarinho
recorda a sua rama…
Outrora era novo
Agora, quando invoca o nascer
As suas penas o julgam perdido
Na ira dos ventos vai morrer…
Triste passarinho
Triste emigrante sem destino.
Veio de uma terra distante
Em busca de outro caminho
Na vida há sempre aves
E uma ave não morre deitada….
Sem nada!
recordando o sonho que levou
Soltou a vida
Deixando nas recordações
As terras que semeou.
É noite!
Amanhã o sol voltará de novo
Mas ele já voou…
Lisboa, 14 de Fevereiro de 1969
(não resisti à tentação de vos dar a ler um poema de 1969 que recuperei dum velho caderno. O meu pedido de desculpas pelo atrevimento, mas está tal e qual como o escrevi quando tinha 19 anos, muitas preocupações e muitos sonhos...)
DIÁSPORA
Rogério Martins Simões
Gosto de viajar para casa!
Regressar é um desejo de quem parte
e não quer ir.
Vou!
Já fui tantas vezes na aventura
calcetando pedras,
dormitando em tábuas,
onde me perco sem contemplações,
encalhando nos confins das terras,
amealhando uns tostões.
Tivesse asas para acompanhar o
pensamento
porque as asas só se levantam tendo
penas.
Penas tenho!
Pena não tenho!
Da fome e dos xailes pretos…
Deixei em casa corpos em metamorfose,
silêncios e silvas,
que crescem entre muros e dão
amoras…
Comprei a última tesoura de podar
Tenho a barriga a dar horas
E um sonho para voltar...
A vinha ficou brava…
A horta e a casa fechada
são agora um pasto de chamas.
- Aldeia porque me chamas filho
se só tive madrasta!?
- Nação porque me pedes o voto
se não te sei ler!?
Gosto de regressar mas não posso
ficar…
Falo agora esta meia língua estranha,
porque já esqueci a minha…
Volto a percorrer as estradas
que me afastam do que resta...
Levo uns trocos para a viagem
e quando me virem vai ser cá uma
festa…
Vou petiscar couratos
e beberei uns copos
com os rapazes do meu tempo.
Regressarei um dia para cuidar da
vinha…
Por agora durmo a sesta…
Voltarei para cumprir a promessa.
E beberei nos corpos deixados,
um néctar guardado,
entre fragas e pinheiros…
Verberarei palavras de fel,
embrulhadas com cargas de explosivos
abrindo estradas,
caminhos que me deixaram partir
Agora tenho de ir…
Regressarei à casa nova que construí,
e em cada degrau,
limparei as lágrimas definitivas
da minha saudade.
Vou partir mas tenho de regressar…
Oh Pátria amada,
onde se acolhem os sonhos do meu
regresso,
porque me deixaste partir?
Oh Pátria amada deixa-me regressar
ainda que só te enxergue,
no que resta,
penhascos e pedras pretas.
Quero todo o barro, granito ou lousa
Quero a água cristalina que emergia das
fragas.
Quero depositar uma coroa de rosas
nas campas rasas dos meus pais.
E um coroa de espinhos nos despojos
dos que me obrigaram a seguir…
Sonhei voltar.
Não voltarei para partir…
Não voltarei a sonhar.
Vou ficar
Tenho filhos e netos neste lugar
Retalha a saudade no que resta do meu
corpo!
Viajarei gavião….
Por agora recebo notícias do meu país
- Dizem que as motas todo-o-terreno
debutaram nas silvas da minha aldeia…
E se a língua portuguesa é a minha raiz
profunda,
afundo as minhas mágoas por não poder
regressar,
Porque, agora, regresso, escreve-se
noutra língua
e já nem sei o caminho de retorno…
8/03/2007
(Este poema é dedicado ao grande poeta português Armando Figueiredo - Daniel Cristal e a todos os emigrantes na diáspora.)
(foto da autoria de Padre Pedro - Pampilhosa da Serra)